Ansiedade e palpitações
- Géssica Magalhães
- 18 de out.
- 4 min de leitura

Ansiedade e Palpitações: Quando a Mente Acelera o Coração
O coração acelera. Um aperto no peito. A respiração encurta. As mãos suam. Para muitas pessoas, esse conjunto de sintomas é familiar e assustador. As palpitações são uma das queixas mais comuns nos consultórios médicos e frequentemente estão associadas à ansiedade, um dos transtornos mais prevalentes da atualidade.
Embora nem sempre representem perigo, as palpitações causadas por estados emocionais alterados exigem atenção, investigação e abordagem multidisciplinar, já que afetam tanto a saúde mental quanto a saúde cardiovascular.
O que são palpitações?
Palpitações são definidas como a percepção anormal do próprio batimento cardíaco. O indivíduo sente o coração “bater forte”, “acelerado”, “descompassado” ou “batendo no pescoço ou no peito”.
Podem ser causadas por:
Estímulos fisiológicos (atividade física, susto, emoção);
Disfunções cardíacas (arritmias, doenças estruturais);
Desequilíbrios hormonais ou metabólicos;
Uso de substâncias estimulantes;
Transtornos de ansiedade.
Ansiedade: o combustível invisível das palpitações
A ansiedade é uma reação natural do organismo frente a uma ameaça percebida. O problema surge quando essa resposta é exagerada, constante ou desconectada de um risco real. Nesses casos, o corpo entra em estado de hiperalerta, e o coração é um dos primeiros órgãos a responder.
Essa reação é mediada pelo sistema nervoso simpático, que libera adrenalina e noradrenalina, acelerando os batimentos cardíacos, aumentando a pressão arterial e direcionando sangue para os músculos.
Segundo a American Psychological Association (APA), cerca de 90% dos pacientes com transtornos de ansiedade relatam algum grau de sintomas cardiovasculares, sendo as palpitações os mais frequentes.
Como diferenciar uma palpitação ansiosa de uma arritmia?
Essa é uma das grandes dúvidas tanto de pacientes quanto de profissionais. A seguir, algumas pistas que auxiliam na distinção:
Característica | Palpitação Ansiosa | Arritmia Cardíaca |
Início | Gradual, associada a pensamentos ou tensão | Súbito e inesperado |
Duração | Minutos a horas, geralmente intermitente | Pode durar segundos ou horas |
Desencadeantes | Estresse, medo, ambientes cheios, gatilhos emocionais | Sem causa emocional identificável |
Sintomas associados | Falta de ar, sudorese, tremores, tontura leve, sensação de morte iminente | Desmaios, dor no peito, síncope |
Exames cardíacos | ECG, Holter e teste ergométrico normais | Pode haver alterações em exames |
A ESC (European Society of Cardiology) recomenda investigação cardíaca completa sempre que houver dúvida diagnóstica, principalmente em pacientes com fatores de risco cardiovascular.
A ponte entre ansiedade e sistema cardiovascular
A saúde mental e a saúde cardiovascular estão intimamente interligadas por múltiplos caminhos fisiológicos:
O sistema nervoso autônomo regula tanto o humor quanto o ritmo cardíaco;
A ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal gera liberação contínua de cortisol, que afeta diretamente o miocárdio e os vasos;
A inflamação sistêmica de baixo grau presente na ansiedade crônica contribui para disfunção endotelial e aumento do risco de hipertensão;
A variabilidade da frequência cardíaca (VFC), marcador de equilíbrio autonômico, é reduzida em indivíduos com transtornos ansiosos, o que representa pior adaptação ao estresse e maior risco cardíaco.
A AHA (American Heart Association) já reconhece a ansiedade como fator de risco para eventos cardiovasculares, sobretudo em pessoas com predisposição genética ou doenças cardíacas preexistentes.
Palpitações psicogênicas: uma manifestação real da ansiedade
É importante ressaltar que as palpitações causadas por ansiedade não são “imaginação do paciente”. Elas são manifestações físicas reais, com alterações transitórias no funcionamento cardíaco e autonômico, mesmo que os exames sejam normais.
Essas palpitações podem desencadear um ciclo de retroalimentação:
A pessoa sente o coração acelerar;
Acredita estar em risco;
Ativa ainda mais o sistema simpático;
Agrava os sintomas;
Entra em pânico ou evita situações;
Reforça o quadro ansioso.
Esse ciclo pode ser rompido com psicoeducação, suporte psicológico e estratégias de regulação emocional.
O impacto na qualidade de vida
Indivíduos com palpitações frequentes e ansiedade mal controlada costumam:
Evitar atividades físicas por medo de “morrer do coração”;
Buscar atendimento de urgência repetidamente, mesmo sem alterações clínicas;
Desenvolver fobia de locais públicos (agorafobia);
Abandonar compromissos sociais e profissionais;
Sofrer com insônia, irritabilidade e baixa autoestima.
Por isso, o tratamento deve ir além do alívio sintomático e buscar reconstruir a sensação de segurança interna do paciente.
Abordagem baseada em evidências
O tratamento deve ser multidisciplinar, envolvendo cardiologista, psicólogo, psiquiatra e equipe de apoio. As principais estratégias incluem:
1. Psicoterapia: A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é a mais indicada. Ajuda o paciente a:
Identificar pensamentos distorcidos (“vou ter um infarto”);
Aprender técnicas de enfrentamento;
Reduzir hipervigilância corporal.
2. Medicamentos: Em casos moderados a graves, antidepressivos ISRS e ansiolíticos de curta duração podem ser prescritos com segurança;
O uso de betabloqueadores, quando bem indicado, pode ajudar a controlar sintomas autonômicos.
3. Técnicas de respiração e relaxamento:
Coerência cardíaca;
Respiração diafragmática;
Meditação guiada e atenção plena.
4. Estilo de vida saudável
Atividade física regular;
Sono de qualidade;
Redução de cafeína, álcool e ultraprocessados;
Criação de rotinas seguras.
Em resumo:
Palpitações são sintomas comuns da ansiedade e impactam diretamente a saúde mental e a percepção de bem-estar;
Podem mimetizar arritmias, exigindo uma avaliação médica criteriosa;
A ansiedade crônica prejudica a função cardiovascular por meio de mecanismos neuroendócrinos e inflamatórios;
O tratamento deve integrar intervenções clínicas, psicoterapêuticas e comportamentais;
Educar o paciente sobre seu quadro é uma das formas mais eficazes de restaurar o equilíbrio corpo-mente.




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